terça-feira, 10 de agosto de 2010

O rosto negro


Depois do trabalho, corro para casa como se tivesse asas no dorso, porque as palavras me saltam na ansiedade. Instantes decorridos, dispo-me da máquina com rodas na toca das sombras e subo as setenta e duas escadas num só fôlego. Assim que venço a última, a saliva sem oxigénio tropeça num papel colado na porta do vizinho. Acumulo bisbilhotices nas orelhas até sentir a inevitabilidade nas vontades. Aí, já quase no desespero, deslizo o olhar para o texto, “Este imóvel está em hasta pública”. Deito-me com as exclamações no abismo inexplicável e farejo que o Doutor dos Doutores, sempre acorrentado ao ouro, me sorriu ontem com um cheque sem cobertura.

1 comentário: