sexta-feira, 31 de julho de 2015

TARDE

A tarde começa a sair do céu. E no azul pardacento existe duas linhas brancas a rasgar o norte. Perto delas há pássaros com asas abertas. Debaixo deles existem braços e pernas a mexerem-se com veemência, com intuito de expelir a tristeza e colocar a mente em cima dos ombros. O ritmo é dado pela música louca, por vezes tresloucada, por vezes diabólica. Por fim, tudo termina. Mas tudo recomeça quando a noite lambe a periferia das estrelas.

Simples

Olho para a multidão que aponta os defeitos dos outros e conheço o inferno.

quinta-feira, 23 de julho de 2015

SIMPLES

O uso e abuso das estratégias utópicas, leva a coser remendos em fatos que não vestem ninguém, ou, até, a empreender lutas que provocam estragos dificilmente reparáveis.

segunda-feira, 20 de julho de 2015

EXCERTO

(excerto em bruto do texto que escrevo...)

O Zé da Tina assoa o nariz. Como há manchas vermelhas na manga do pijama e no bordo do lençol e muco na gola e resquícios no queixo, o meu nariz fica enfastiado. Engulo o vómito que ele me provocou e tiro o suor da testa. Ele chupa-me o sentimento. Por isso, as mãos dele procuram nojo nas partes ocultas. O embate torna-se inevitável. A sequela disso é irracional porque os braços parecem hélices com nervos nas pontas. Perto do fim, um pedaço gordo desprende-se da mão. Faz uma viagem sem turbulências, sem desvios, e aterra, com distinção, nos cabelos dos Carga de Ossos. Fico mudo, mas os ouvidos fotografam a voz do vulcão que expele montanhas para o Zé da Tina. A cama articulada é por isso uma base murcha, com água a circular pelo meio. Para evitar anomalias no futuro, coloco o corpo a fazer de muro e atiro placidez aos nervos. Eles cospem-me impropérios, lançam-me farpas e amansam quando insisto. Porém, dizem à tristeza que, para a próxima, o guarda-chuva será aberto porque não querem ter mais bronquite no cabelo. O tiro foi doloroso. E o Zé da Tina, com o peito ferido, enrijece os músculos. Depois dá pinchos histéricos, dá bofetadas a tudo e dá nervos à língua. Quando os dentes perdem a força, há palavras que são armas e há frases que são bombas: “Cabeças de arroz”, “Formigas caquécticas”, “Vou enfiar-vos o guarda-chuva no olho do…”, “Chega”, grito-lhe, “Chega. Ouviste? Chega. A discussão termina agora”, e olho para os Carga de Ossos. O peso da ordem submete-os ao pudor camuflado pelo cabelo.

segunda-feira, 13 de julho de 2015

BANHO DE LÁGRIMAS

- há uma tempestade de lume a mastigar as árvores
os arbustos
as flores
os animais
há uma tempestade de lume a chafurdar-se no grito das pessoas

- há lenços negros junto das estrelas
há pontas de medo a correr nas veredas

-quando a alvorada estende o lençol
a aldeia é um monte de cinzas e o futuro é um banho de lágrimas

terça-feira, 7 de julho de 2015

CIRCO

Em cima da erva, o Victor Hugo Cardinali brinca com os leões. À volta, os meninos, sentados nas bancadas, mastigam alegrias e os pais escondem os ouvidos.